Histórias do Mundial: A Batalha de Santiago, o jogo mais violento da história dos Mundiais (1962)
- Updated: 28/10/2022
Em 1960, o Chile sofreu o pior terramoto da história do mundo moderno, apenas 2 anos antes de receber o Mundial de 1962. O terramoto destruiu parte do país e colocou grandes obstáculos à forma como o evento ia decorrer.
Após o terramoto, muitos países não queriam que o Chile continuasse a ser o anfitrião do Mundial de 1962 e o país tornou-se o alvo de muitas críticas nos meios de comunicação social dos países que iriam participar. Mesmo o próprio governo não queria continuar com os planos de organização da competição, uma vez que o país estava a recuperar do desastre que devastou o país.
A liderança do Chile acabou por decidir a realização do Mundial e prosseguiram com os planos originais de sediar esta grande competição. Os chilenos ficaram furiosos quando perceberam que as outras nações não queriam que fosse o Chile o anfitrião do torneio. Por isso, antes de o Mundial começar, o Chile sentiu que o mundo estava contra eles, e isto levou a que o Mundial de 1962 tenha sido um dos torneios mais violentos de sempre.
A “Batalha de Santiago” é o maior exemplo dessa violência, um jogo que ficou acima de todos os outros em termos de violência, perturbação e pura loucura.
A tensão antes do jogo
Com o terramoto de 1960 e a subsequente decisão do Chile em realizar o Mundial de 1962 tal como estava programado, as críticas dos países participantes foram aumentando, com a Itália a ser um dos países que mais criticou a decisão e não foi propriamente amável tendo em conta a conjuntura vivida no Chile. Vários jornais em Itália usaram frases como “pura loucura” relacionadas com o facto de o Chile ser o anfitrião do evento, mesmo depois da destruição provocada pelo terramoto. Os jornais no Chile descobriram estes artigos e relataram-nos nos seus próprios jornais com grande destaque, o que agitou ainda mais a população local. Isto criou uma enorme tensão entre as duas equipas mesmo antes de o jogo começar.
Mesmo durante o Mundial, os jornalistas italianos continuaram a fazer a cobertura do evento de forma crítica, insultando a cidade de Santiago e o Chile. Devido a uma série de descrições hostis sobre vários aspetos da cidade de Santiago que foram publicadas nos media italianos, a Itália foi se tornando o inimigo número um dos chilenos.
Por outro lado, a verdade é que os media chilenos também não foram muito amáveis com os italianos, não se tratando de uma situação unilateral, mas sim de um confronto entre os 2 países. Os jornais chilenos descreveram a equipa e a nação italiana como mafiosos e fascistas, fazendo conexões à Segunda Guerra Mundial. É neste contexto que as duas equipas se preparam para jogar uma contra a outra, e assim conseguimos perceber que o clima que se vivia antes do jogo era de tensão e ódio entre as 2 nações.
O jogo que ficará na história
O Chile jogou contra a Itália no segundo jogo da fase de grupos, um jogo que teve lugar em Santiago, daí o nome da “Batalha de Santiago”. Esta foi a primeira vez que os 2 países jogaram um contra o outro e, na verdade, depois do jogo, muitos esperavam que tivesse sido a última.
O jogo mal pode ser considerado futebol dado a extrema violência que teve lugar durante a partida, e que muitos descreveriam como uma forma de luta organizada em vez de futebol.
12 segundos depois já há uma falta
Este não foi um jogo normal e logo aos 12 segundos foi cometida uma falta, que apesar de não ter sido muito grave deu uma sensação de que o jogo não seria muito pacífico. Se num jogo normal uma equipa começa com o pontapé de saída e passa a bola algumas vezes para ter uma ideia do jogo, aqui isso não aconteceu.
O árbitro inglês, Ken Aston, estaria prestes a viver talvez o seu maior desafio ao ter de fazer cumprir as regras de um jogo que não parecia um jogo.
Chilenos cuspiram nos italianos
De acordo com os relatos, os jogadores chilenos começaram a cuspir nos italianos desde o início do jogo. Alguns relatos até afirmam que estavam a cuspir nos italianos no túnel à saída do campo, embora isso não tenha sido confirmado. Independentemente de este incidente em particular ter acontecido ou não, o facto de os jogadores chilenos estarem a cuspir na equipa adversária já em si é uma vergonha.
Por outro lado, os jornais italianos estavam a dizer coisas muito más sobre os chilenos e o seu país, tal como mencionado acima. Este conflito exterior ao jogo acabou por se refletir no campo e tornou este jogo num momento triste para o futebol mundial. Apesar dos cuspidos, não houve nenhuma expulsão por este tipo de comportamento, o que levou a que a situação ficasse muito pior.
Itália recebe cartão vermelho aos 8 minutos
Após os incidentes iniciais, aos 8 minutos o jogador italiano Giorgi Ferrini recebeu um cartão vermelho do árbitro. Ferrini não concordou com a falta e recusou-se a abandonar o campo. Esta situação durou cerca de 10 minutos e Ferrini começou a discutir com o árbitro por se opor à sua decisão, assim como o resto dos jogadores italianos. Quando as coisas começaram a ficar fora de controle, a polícia teve de entrar em campo e escoltar Ferrini para fora do campo.
Esta foi uma situação sem precedentes num Mundial de futebol, ainda para mais acontecer logo aos 8 minutos de jogo. O momento fez com que ficasse visível a parcialidade do árbitro a favor do Chile.
Confrontos físicos marcaram este jogo
Ao longo do jogo, a situação foi ficando cada vez mais tensa. Os jogadores envolveram-se em lutas físicas e a determinada altura, o jogador chileno Leonel Sanchez deu um murro no nariz de Humberto Maschio, jogador italiano. O confronto físico fez com que Sanchez partisse o nariz de Maschio, no entanto, o árbitro não fez nada. Após o jogo, o árbitro afirmou que não viu o murro, mas muitos duvidam que isso seja verdade.
Surpreendentemente, este não foi o primeiro murro dado por Sanchez neste jogo. Ele já tinha batido no jogador Mario David no início do jogo, o que levou a outro grande incidente nesta partida.
Em 41 minutos a Itália recebe 2 cartões vermelhos
Sanchez estava a causar vários incidentes durante o jogo e ficava claro que não estava ali para cumprir as regras. Ele foi o centro das atenções durante o jogo e não pelos melhores motivos, sendo que quase todos os incidentes que ocorreram durante o jogo foram causados por ele.
Como mencionado acima, Sanchez deu um murro a Mario David. Alguns minutos depois, quando David retaliou esse murro ao tentar dar-lhe um pontapé na cabeça, o árbitro assinalou cartão vermelho e mandou-o embora. É evidente que estas atitudes estão muito além daquilo que se consideraria ser o aceitável num jogo de futebol.
Apesar disso, Sanchez não recebeu qualquer castigo pelo murro a David o que enfureceu os italianos ainda mais. Para além de não castigar Sanchez, o árbitro não teve capacidade de arbitrar o jogo de forma neutra e acabou por ser fortemente criticado durante anos por causa dos incidentes desse dia.
Quatro intervenções policiais durante o jogo
O primeiro momento de tensão vivido neste jogo foi quando Giorgi Ferrini foi escoltado pela polícia após ser expulso do jogo aos 8 minutos. Esse foi a primeira intervenção policial do jogo que contou no total com 4 intervenções policiais para conseguir controlar a violência crescente entre as 2 equipas.
Apesar de a polícia ter entrado em campo mais 3 vezes, só Ferrini é que foi escoltado para fora do campo. A política esteve armada e fez questão de impor respeito para que a situação pudesse ser controlada. O jogo foi uma vergonha para o futebol profissional e é uma reflexão sobre a necessidade de fair play durante as competições.
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